Gilberto Melo

Código do Consumidor não vale para as ações de prestação de contas

Os bancos perderam uma disputa na 2ª Seção do STJ sobre a aplicação do Código de Defesa do Consumidor em ações que questionam lançamentos em contas correntes.

A controvérsia resume-se à verificação da incidência da regra prevista no art. 26, II, do CDC, à ação de prestação de contas ajuizada pelo cliente de instituição financeira, visando a obter esclarecimentos acerca de lançamentos realizados em conta corrente de sua titularidade, os quais reputa indevidos.

Os ministros decidiram que o prazo de 90 dias para reclamar de vícios aparentes ou de fácil constatação não vale para as ações de prestação de contas ajuizadas por clientes para discutir cobrança de taxas, tarifas e encargos bancários.

O julgado concluiu que, nesse caso, aplica-se o prazo estabelecido no Código Civil (dez anos, no novo; ou 20 anos, no CC de 1916, dependendo da época dos fatos que são abordados na ação). Os ministros, por maioria, seguiram o voto da relatora, ministra Maria Isabel Gallotti.

O julgamento tinha sido iniciado em abril e foi retomado na quarta-feira (10) com o voto-vista do ministro Sidnei Beneti. A análise do caso envolve um cliente paranaense do Banco do Brasil e já tinha sido interrompida duas vezes.
 
O acórdão questionado é do TJ do Paraná,  que decidiu favoravelmente ao BB, ao modificar sentença oriunda da comarca de Toledo (PR).

Em abril, votou a relatora, que se manifestou contra a aplicação do CDC. No mês seguinte, a ministra Nancy Andrighi apresentou seu voto-vista, seguindo a relatora.

Posteriormente, o ministro João Otávio de Noronha acatou a tese apresentada pelos bancos.

Para a ministra Maria Isabel, “nem todos os conflitos de interesse ocorridos no âmbito de relações contratuais regidas pelo CDC  podem ser enquadrados como vício ou defeito do produto ou serviço, de modo a ensejar a incidência dos prazos de decadência (artigo 26) ou de prescrição (artigo 27) estabelecidos no referido diploma legal”.

Ela também sustentou que “estando fora dos conceitos legais de vício ou defeito, aplica-se o prazo de prescrição do Código Civil”.

O acórdão – ainda não publicado – vai exemplificar o que poderia ser enquadrado como vício de serviço bancário. “Poderia eu figurar a hipótese de um investidor que solicitasse a aplicação de seus recursos em determinado tipo de investimento de risco e o empregado do banco o aplicasse em caderneta de poupança ou vice-versa. Não reclamado pelo correntista o equívoco na prestação do serviço no prazo decadencial de 90 dias, perderia o direito de postular ressarcimento por eventual prejuízo ou diferença de rendimentos. Igualmente ocorreria vício de serviço, se o banco deixasse de promover o débito em conta de fatura previamente agendada”, diz a relatora.

Segundo a maioria da 2ª Seção, o débito em conta corrente de tarifa bancária “não se enquadra no conceito legal de vício de quantidade ou qualidade do serviço bancário e nem no de defeito do serviço, tratando-se de custo contratual dos serviços bancários, não dizendo respeito à qualidade, confiabilidade ou idoneidade dos serviços prestados”.

A Federação Brasileira de Bancos (Febraban), admitida como ´amicus curiae´ sustentou como alternativa, no caso de ser afastada a aplicação do artigo 26 do CDC, a adoção de um prazo de três ou, no máximo, cinco anos, com fundamento nos artigos 206, do Código Civil (pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa) e 27 do CDC (reparação de danos por fato do produto ou do serviço). A Febraban não teve êxito.

O advogado Julio César Dalmolin atua em nome do correntista.

Tendo em vista a multiplicidade de recursos com fundamento em mesma questão de direito e tendo sido o REsp afetado como recurso repetitivo, a decisão será aplicada em todos os recursos congêneres. (REsp nº 1.117.614).

Fonte: www.espacovital.com.br