Gilberto Melo

Correção monetária sobre TDAs e o obscurantismo da jurisprudência do STJ

Estuda-se a correção monetária incidente sobre os Títulos da Dívida Agrária – TDAs, apontando os principais equívocos da jurisprudência atual do STJ.

Um dos temas mais palpitantes no âmbito das ações de desapropriações para fins de reforma agrária é o relativo à incidência de correção monetária sobre os chamados Títulos da Dívida Agrária – TDAs.

Não muito raro, o Poder Judiciário é desafiado a resolver demandas cuja principal discussão é saber se incide ou não correção monetária sobre os TDAs e qual a lei de regência daquele caso concreto.

Acerca dessa controvérsia, observa-se que vários equívocos são cometidos por alguns operadores do Direito que militam na seara do Direito Agrário. E o primeiro equívoco é cometido quando não se faz a necessária diferenciação entre os TDAs que já foram emitidos logo no início da ação de desapropriação e os TDAs complementares que serão emitidos quando houver diferença entre o valor da condenação e o valor ofertado pelo entre expropriante.

O próprio egrégio Superior Tribunal de Justiça, cuja missão constitucional é uniformizar a interpretação da lei federal, não tem feito essa diferenciação e isso só pode ser debitado à pouca profundidade com que o tema é abordado pela Corte.

Em razão da aludida superficialidade com que essa matéria é tratada, verifica-se no âmbito daquela Corte Superior a formação de entendimento jurisprudencial que guarda o seguinte teor:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DESAPROPRIAÇÃO. ARTIGOS INFRACONSTITUCIONAIS TIDOS POR  VIOLADOS NÃO PREQUESTIONADOS PELA INSTÂNCIA ORDINÁRIA.INCIDÊNCIA DA SÚMULA 282/STF. TDA’S. CORREÇÃO MONETÁRIA. CABIMENTO. PRECEDENTES. ACÓRDÃO A QUO EM CONSONÂNCIA COM O ENTENDIMENTO EXARADO PELO STJ. SÚMULA 83/STJ. 

  1. A matéria inserta nos arts. 741, II, V e parágrafo único, e743, I, do Código de Processo Civil – CPC não foi debatida pelo acórdão hostilizado, de modo que não foi atendido o requisito  inarredável do prequestionamento. Incidência, na espécie, da Súmula n. 282/STF.
  2. Esta Corte Superior possui entendimento no sentido de que é devida a correção monetária dos Títulos da Dívida Agrária – TDAs, porquanto raciocínio inverso implicaria desvirtuamento da cláusula constitucional que garante a justa indenização.Precedentes: AgRg no REsp 1066423/DF, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 11/02/2009; AgRg no REsp 1273903/DF, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 04/11/2011.
  3. Dessarte, o acórdão do Tribunal a quo guarda perfeita consonância com a jurisprudência desta Corte Superior, incidindo, no presente caso, o enunciado da Súmula 83/STJ, in verbis: “Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido dadecisão recorrida.”
  4. Agravo regimental não provido.

(AgRg no AREsp 91.422/SE, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 8.5.2012, DJe 14.5.2012.)

No entanto, se é certo que o raciocínio plasmado no precedente acima transcrito é válido em relação aos TDAs complementares, não menos certo é que ele não é válido em relação aos TDAs já emitidos e depositados logo no início da demanda expropriatória.

E isto por que, uma vez emitidos e depositados os TDAs no início da demanda, deve-se obedecer, no que se refere à CORREÇÃO MONETÁRIA e aos JUROS, o quanto disposto no art. 5º, caput e § 3º da Lei n. 8.177/91 (que dispõe sobre regras de desindexação da economia), com redação dada pela MP n. 2.183-56/2001que prevê correção monetária e juros remuneratórios específicosin verbis:

Art. 5° A partir de 1° de março de 1991, o valor nominal das Obrigações do Tesouro Nacional (OTN), emitidas anteriormente a 15 de janeiro de 1989 (art. 6° do Decreto-Lei n° 2.284, de 10 de março de 1986), dos Bônus do Tesouro Nacional (BTN), emitidos até a data de vigência da medida provisória que deu origem a esta lei, das Letras do Tesouro Nacional, de Série Especial (§ 1° do art. 11 do Decreto-Lei n° 2.376, de 25 de novembro de 1987), e dos Títulos da Dívida Agrária (TDA), será atualizado, no primeiro dia de cada mês, por índice calculado com base na TR referente ao mês anterior.

  • 1° O disposto neste artigo aplica-se também aos BTN emitidos anteriormente à vigência da medida provisória que deu origem a esta lei, com cláusula de opção, ficando assegurada, por ocasião do resgate, a alternativa de atualização com base na variação da cotação do dólar norte-americano divulgada pelo Banco Central do Brasil.
  • 2° Os BTN-Série Especial, emitidos em conformidade com o§ 2° do art. 9° da Lei n° 8.024, de 12 de abril de 1990, passam a ser atualizados, a partir de 1° de fevereiro de 1991, pela TRD, acrescidos de juros de seis por cento ao ano, ou fração pro rata.
  • 3o  A partir de 5 de maio de 2000, os Títulos da Dívida Agrária – TDA emitidos para desapropriação terão as seguintes remunerações: (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)

        I – três por cento ao ano para indenização de imóvel com área de até setenta módulos fiscais; (Incluído pela Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)

        II – dois por cento ao ano para indenização de imóvel com área acima de setenta e até cento e cinqüenta módulos fiscais; e (Incluído pela Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)

        III – um por cento ao ano para indenização de imóvel com área acima de cento e cinqüenta módulos fiscais. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)
Em verdade, o obscurantismo desse entendimento encampado pelo STJ somente pode ser explicado se olharmos para os precedentes que estão na origem da formação dessa inclinação jurisprudencial.

Com efeito, o entendimento jurisprudencial no sentido de que “é devida a correção monetária dos Títulos da Dívida Agrária – TDAs” finca suas raízes em acórdãos proferidos pela Primeira Seção do colendo Superior Tribunal de Justiçaque tinham como pano de fundo a discussão acerca da inclusão dos índices inflacionários expurgados pelos Planos Governamentais (Plano Bresser/1987, Collor II/1991, etc) para os títulos da dívida agrária emitidos anteriormente a tais planos, bem assim a discussão acerca da incidência de juros moratórios e compensatórios sobre TDAs vencidos e não pagos, como por exemplo, os acórdãos proferidos no MS nº 5.857/DF e no MS nº 8.341/DF.

Para certificar-se dessa afirmação, basta conferir os seguintes trechos do Relatório e do Voto-Condutor do acórdão prolatado no MS nº 8.341/DF, acima referido. Confira-se:

Relatório

MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS: Umberto Bastos Sacchelli impetrou Mandado de Segurança contra ato praticado pelo Senhor Ministro de Estado da Fazenda.

O impetrante apresenta os argumentos alinhados a seguir:

  1. a) É senhor e legítimo possuidor de 873 (oitocentos e setenta e três) Títulos da Dívida Agrária – TDA’s, que relaciona em sua petição.
  2. b) Pretendeu, nos termos do Decreto n.º 578, de 24.06.92 (fls. 57⁄59), a inclusão dos seus títulos na Central de Custódia e Liquidação Financeira de Títulos – CETIP encontrando, no entanto, resistência da autoridade ora impetrada, “que se nega a aceitá-los pelo valor corrigido, considerando os índices expurgados de 8,03% – resultante da edição do Plano Bresser em 1987 – e 13,89% de fevereiro de 1991, advindo do Plano Verão,em clara violação a direito líquido e certo do Impetrante, como se pode verificar na Portaria STN n.º 35, publicada no DOU de 05 de fevereiro de 1.999.“;
  3. c) Referidos títulos devem ser corrigidos segundo a desvalorização da moeda, de modo a preservarem o seu valor real, consoante o preceito ínsito no art. 184 da Constituição Federal e a legislação de regência;
  4. d) Não bastasse isso, a autoridade impetrada, após o vencimento dos títulos, fez cessar a incidência dos juros compensatórios fixados em 6% ao ano, isto é, eximiu-se do pagamento dos juros que vinham remunerando o capital, opondo-se, ainda, ao lançamento dos juros moratórios, de 6% ao ano, também a partir do vencimento;
  5. e) No que tange à correção monetária, o Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que é devida no resgate dos TDA’s, “para assegurar ao expropriado um preço sempre real“, com a garantia de “valor aquisitivo estável e indenização justa.” (MS 1.101, Min. Garcia; MS 1.023, Min. Demócrito);
  6. f) A Constituição atual realçou o princípio, nesse particular, ao garantir não simplesmente a exata correção monetária, mas sim, “a preservação do valor real” dos TDA’s (artigo 184);
  7. g) Assim, a utilização de outro índice, que não reflita a real evolução da moeda, ainda que decorra de lei, representa nítida violação ao preceito constitucional contido no art. 184, da CF⁄88 (MS 4.005⁄DF-Min. Asfor);
  8. h) No tocante à negativa da autoridade impetrada, consistente em não computar os juros compensatórios, após o vencimento dos títulos, limitando-se à simples correção monetária daqueles lançados até o seu vencimento, já houve manifestação da própria Procuradoria Geral da Fazenda, determinando a sua inclusão juntamente com os juros moratórios previstos no art. 1.062 do CC (parecer PGFN⁄CRJN⁄n.º 515⁄95);
  9. i) A inclusão dos juros compensatórios e moratórios sobre os Títulos da Dívida Agrária, não resgatados, não é tema novo no STJ, que, por unanimidade dos Ministros da 1ª Seção, decidiram afirmativamente (MS 3.186⁄DF);
  10. j) Requer o impetrante seja-lhe concedida a ordem, “a fim de que, por ocasião da inclusão dos referidos títulos na Central de Custódia e Liquidação Financeira de Títulos – CETIP, na forma estabelecida pelo Decreto n.º 578⁄92“, sejam lançados juntamente com o valor principal: (fl. 14)

– os índices de 8,03% e 13,89%, correspondentes à correção monetária suprimida em razão dos Planos “Bresser” e “Collor II”;

– os juros compensatórios e moratórios de 6% a.a., devidos a partir do vencimento dos títulos e, daí em diante, até o respectivo resgate.

[…]

Voto

MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS (Relator): O pedido de Segurança merece acolhida, em parte.

Preliminarmente observo que a Ordem teria caráter preventivo: o impetrante não recebeu qualquer pagamento.

O impetrante diz ser possuidor de 873 (oitocentos e setenta e três) Títulos da Dívida Agrária – TDA’s, conforme descrito na inicial, informação não elidida pelo informante.

Entende que referidos títulos devem ser corrigidos mediante aplicação dos índices expurgados de 8,03% e 13,89%, resultantes da edição dos chamados Plano Bresser, de junho⁄87 e Plano Verão, de fevereiro⁄91, respectivamente, negando, no entanto, o impetrado a sua inclusão na Central de Custódia e Liquidação Financeira de Títulos – CETIP, inclusive com o cômputo dos juros compensatórios e juros de mora devidos, de 6% a.a., nos termos da Lei n.º 8.177⁄91 e do Decreto n.º 578⁄92, a partir do vencimento dos TDA’s.

Trouxe à colação decisões do STJ, dizendo da procedência da correção monetária sobre os títulos em comento, não liquidados, considerando os mencionados expurgos inflacionários, bem como dos juros compensatórios e moratórios.

O impetrante reivindica dita correção monetária e juros, por ocasião da inclusão dos títulos na CETIP, como direito líquido e certo a ser atendido.

A tais alegações opõe-se a autoridade tida por coatora, com argumentação deduzida nos seguintes termos:

1 – O pedido não tem condições de prosperar, em face da ausência de certeza e liquidez da pretensão. Sob esse argumento, pede, em preliminar, o indeferimento da inicial.

2 – Como segunda preliminar, invoca a Súmula 269⁄STF, no entendimento de estar o autor pretendendo mandado de segurança como ação de cobrança, e como tal deve ser repelido.

3 – Na questão de fundo, alega que a correção dos TDA’s obedecem aos preceitos legais.

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça segue a orientação de que é devida a correção monetária sobre os TDA’s vencidos e não quitados, aplicando-se os índices de 6,81 (Plano Bresser) e 13,89% (Plano Collor II), acrescidos de juros compensatórios e moratórios de 6% a.a., a partir do vencimento dos títulos. Exemplifico:

MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. TÍTULO DA DÍVIDA AGRÁRIA – TDA. DECLARAÇÃO DO DIREITO DO PARTICULAR DE INCIDÊNCIA DOS ÍNDICES DE CORREÇÃO MONETÁRIA EXPURGADOS. PLANOS BRESSER E COLLOR II.

I – É admissível a impetração de mandado de segurança com pedido de declaração do direito do proprietário de TDA à incidência de índices de correção monetária expurgados, nos percentuais de 6,81% (Plano Bresser) e 13,89% (Plano Collor II), acrescidos de juros compensatórios e moratórios de 6% a.a., a partir do vencimento do título.

II – Constituindo o cerne da questão a incidência de expurgos inflacionários em título de dívida pública, a natureza do provimento jurisdicional é declaratória, e não condenatória para automática inclusão no sistema fazendário da Central de Custódia e Liquidação Financeira de Títulos – CETIP, porque a eventual natureza condenatória transformaria o mandamus em ação de cobrança com efeitos pretéritos.

III – …Omissis…

IV – Segurança concedida parcialmente.”(MS 6.835⁄Nancy).

Na mesma direção as seguintes decisões desta Primeira Seção: MS’s 7.805⁄DF-Laurita; 7.975⁄DF-Garcia; 5.857⁄DF-Milton; 7.194⁄DF-Delgado; 8.100⁄DF-Fux; 6.254⁄DF-Humberto; 7.670⁄DF-Franciulli; EDMS 5.820⁄DF-Falcão).

[…]

Aliás, a ementa do referido acórdão (MS nº 8.341/DF) é bastante explicita em estabelecer as hipóteses em que incidem correção monetária, juros moratórios e compensatórios sobre TDAs já emitidos: somente na hipótese em que tais títulos venceram e ainda não foram quitados. Veja-se:

Ementa

MANDADO DE SEGURANÇA. TÍTULOS DA DÍVIDA AGRÁRIA – TDA’S. CORREÇÃO MONETÁRIA. EXPURGOS INFLACIONÁRIOS DOS PLANO “BRESSER” E “COLLOR II“. CABIMENTO. JUROS MORATÓRIOS E COMPENSATÓRIOS. DEVIDOS. NÃO APLICAÇÃO, “IN CASU“, DA SÚMULA 269⁄STJ.

  1. Admite-se Mandado de Segurança para determinar que os Títulos da Dívida Agrária sejam corrigidos monetariamente e rendam juros tanto moratórios quanto compensatórios. Tal situação em nada interfere com a Súmula 269 do STF.
  2. A Súmula 269 do Supremo Tribunal Federal deve ser aplicada com temperamentos. É lícita a emissão de Mandado de Segurança para obviar preterição ilegal do resgate de TDA vencido.
  3. O impetrante busca, tão-somente, a declaração do direito à aplicação da correção monetária no valor dos TDA’s, bem como, igualmente, o reconhecimento do direito aos juros compensatórios e moratórios, a partir do vencimento dos títulos, a serem lançados, juntamente com o principal, por ocasião da inclusão destes na Central de Custódia e Liquidação Financeira de Títulos – CETIP.
  4. Está assente a jurisprudência do STJ no sentido de que são devidos os índices de 6,81% (Plano Bresser) e 13,89% (Plano Collor II), sobre os títulos da dívida agrária, assegurados àqueles que tenham sido emitidos anteriormente àquela data, além de juros compensatórios e moratórios de 6% a.a., após vencimento dos TDA’s.
  5. A cláusula de preservação do valor real (CF, art. 184) adere ao TDA, mesmo depois de sua circulação, beneficiando quem quer que seja o portador do título
  6. Segurança parcialmente concedida.

Acórdão

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da PRIMEIRA SEÇÃO do Superior Tribunal de Justiça na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conceder a segurança, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Eliana Calmon, Franciulli Netto, Laurita Vaz, Paulo Medina, Luiz Fux e Garcia Vieira votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Francisco Falcão. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Francisco Peçanha Martins.

Brasília (DF), 11 de setembro de 2002 (Data do Julgamento).

Ocorre que a esmagadora maioria das teses jurídicas, veiculadas nos Recursos Especiais das partes, na atualidade, dizem respeito aos juros e correção monetária que irão remunerar os TDAs após sua emissão até o seu vencimento, e não a respeito de juros e correção que irão eventualmente incidir sobre TDAs vencidos e não quitados.

Assim, para que não se cometa grave violação às disposições da Lei n. 8.177/91, é imperioso que se restrinja a aplicação desse entendimento do STJ aos Títulos da Dívida Agrária – TDAs complementares, ou seja, aqueles a serem emitidos em complementação à indenização, quando o valor ofertado for inferior ao valor da condenação, já que em relação aos TDAs já emitidos no início da demanda, a correção monetária aplicável é aquela própria do título e prevista art. 5º da Lei n. 8.177/91.

Outro grave equívoco cometido pelo STJ ao apreciar essa matéria está relacionado à aplicação do referido entendimento jurisprudencial, ainda quando não há diferença entre o valor ofertado inicialmente e o valor imposto na condenação.

Ora, se o valor efetivamente devido já havia sido integralmente depositado no início da demanda, não há que se falar em mora e tampouco de CORREÇÃO MONETÁRIApois, nos termos do art. 33, caput, do Decreto-Lei nº 3.365/41, “O depósito do preço fixado por sentença, à disposição do juiz da causa, é considerado pagamento prévio da indenização” e, sendo pagamento, extingue a obrigação, não havendo que se falar em valor COMPLEMENTAR a ser pago ao expropriado.

É sabido que, quando há condenação superior à oferta, o valor das benfeitorias segue a ordem dos precatórios, enquanto que para pagamento da terra nua deve-se emitir TDA´s complementaressendo ambos os valores devidamente atualizados antes da emissão.

Mas aí vem a pergunta: e quando o valor fixado na sentença é igual ou inferior ao valor ofertado inicialmente incide correção monetária? A resposta é SIM, mas essa correção monetária é própria da conta bancária em que está depositado o valor relativo às benfeitorias e a prevista para os TDAs já emitidos e depositados.

Com efeito, conforme já mencionado acima, uma vez emitidos e depositados os TDAs no início da demanda, deve-se obedecer, no que se refere à CORREÇÃO MONETÁRIA e aos JUROS, o disposto no art. 5º, caput e § 3º da Lei n. 8.177/91 (que dispõe sobre regras de desindexação da economia), com redação dada pela MP n. 2.183-56/2001que prevê correção monetária e juros remuneratórios específicos.

Por outro lado, há que se considerar que o valor depositado em dinheiro por ocasião da oferta inicial já possui atualização monetária própria da conta bancária em que está depositado, pelo que essa é a única CORREÇÃO MONETÁRIA devida ao Expropriado, não se vislumbrando qualquer prejuízo a este. 

Nesse sentido, confira-se o seguinte precedente: 

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO PARA FINS DE REFORMA AGRÁRIA. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 165, 458 E 535 DO CPC. NÃO-OCORRÊNCIA. JUROS COMPENSATÓRIOS. VALOR DA INDENIZAÇÃO IGUAL AO DA OFERTA INICIAL. INCIDÊNCIA APENAS SOBRE A QUANTIA QUE FICA INDISPONÍVEL PARA O EXPROPRIADO. EVENTUAIS DIFERENÇAS DE CORREÇÃO MONETÁRIA. RESPONSABILIDADE DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA DEPOSITÁRIA. SÚMULA 179/STJ.

(…)

  1. Hipótese em que a indenização fixada corresponde, exatamente, ao valor ofertado no início do feito expropriatório, ou seja, não há nenhuma diferença entre a condenação final e o valor inicialmente ofertado.

(…)

  1. Havendo, por outro lado, no início da demanda, o depósito integral da indenização fixada, a instituição financeira depositária é quem deve responder por eventuais diferenças de correção monetária, nos termos da Súmula 179/STJ, assim redigida: “O estabelecimento de crédito que recebe dinheiro, em depósito judicial, responde pelo pagamento da correção monetária relativa aos valores recolhidos.
  2. A partir da data do depósito, a correção monetária e os juros serão pagos pela instituição financeira depositária, não sendo eles (correção e juros) imputáveis ao expropriante. Súmula 179/STJ.” (REsp 214.996/SP, 1ª Turma, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, DJ de 11.3.2002).
  3. Recurso especial parcialmente provido, para determinar a incidência dos juros compensatórios apenas sobre os vinte por cento (20%) do preço ofertado em juízo,bem como para afastar a responsabilidade do recorrente pelo pagamento de eventuais diferenças de correção monetária.

(REsp 1055418/MT, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/08/2008, DJe 10/09/2008)

Dessa forma, somente se houver diferença entre o valor ofertado inicialmente pelo ente expropriante e o valor fixado na sentença condenatória é que se poderia cogitar da aplicação do entendimento jurisprudencial, segundo o qual “é devida a correção monetária dos Títulos da Dívida Agrária – TDAs”, pois o valor depositado inicialmente não teria sido suficiente para quitar integralmente o valor devidoainda remanescendo valores a serem pagos ao Expropriado, e estes, por óbvio, devem ser pagos corrigidos monetariamente.

Logo se vê que o tema relativo à incidência de correção monetária sobre Títulos da Dívida Agrária – TDAs ainda carece de uma análise mais detida e profunda por parte do colendo Superior Tribunal de Justiça, sob pena de se perpetuar grave violação à legislação federal regente dessa matéria.

Bibliografia:

 AgRg no AREsp 91.422/SE. 91.422/SE, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 8.5.2012, DJe 14.5.2012 (STJ, 14 de maio de 2012).

BRASIL. Coletânea de legislação e jurisprudência agrária correlata/Organizadores Joaquim Modesto Pinto Junior, Valdez Farias. – Brasília: Ministério do Desenvolvimento Agrário, Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural, 2007.

BRASIL. Lei 8.629/93 Comentada por Procuradores Federais: Uma contribuição da PFE/INCRA para o fortalecimento da reforma agrária e do direito agrário autônomo/ Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, Procuradoria Federal Especializada junto ao INCRA. Brasília: INCRA, 2011.

MS 5.857/DF. 5.857/DF, Rel. Ministro MILTON LUIZ PEREIRA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/12/1998, DJ 29/03/1999, p. 59 (STJ, 29 de março de 1999).

MS 8.341/DF. 8.341/DF, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 11/09/2002, DJ 11/11/2002, p. 141 (STJ, 11 de novembro de 2002).

REsp: n. 1.055.418/MT. 1.055.418/MT, REsp 1055418/MT, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/08/2008, DJe 10/09/2008 (STJ, 10 de setembro de 2008).

SILVA, Daniel Leite da. Juros em desapropriação. A verdade sobre a jurisprudência do STF. Jus Navigandi, Teresina, ano 15n. 242419 fev. 2010. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/14374>. Acesso em: 12 nov. 2013.

– Sítios eletrônicos. 

AGU. Disponível na URL: http://www.agu.gov.br/.

INCRA. Disponível na URL: http://www.incra.gov.br/portal/.

STJ. Disponível na URL: .

STF. Disponível na URL: http://www.stf.jus.br/.

Fonte: www.jus.com.br