Gilberto Melo

A capitalização dos juros autorizada pelo STJ

Recentemente o STJ proferiu decisão favorável à capitalização dos juros; em conseqUência, é possível a incidência dos juros sobre os juros. Os ministros entenderam que a capitalização de juros vedada pelo Decreto nº 22.626/33 (conhecido como Lei de Usura) em intervalo inferior a um ano é permitida pela Medida Provisória nº 2.170-36, para as instituições financeiras, desde que expressamente pactuada, estando ligada à circunstância de os juros devidos e já vencidos serem, periodicamente, incorporados ao valor principal. 

Com efeito, nem a legislação de Justiniano, o último imperador romano que faleceu em 565 d.C., permitia esta prática. A sabedoria do Direito Romano Imperial vedava tal procedimento.

Passados mais de mil e quatrocentos anos, eis que é permitida a referida prática no Brasil, num momento em que o endividamento da população encontra-se em índices preocupantes para a banca internacional e para a economia doméstica que reduz os impostos para aquecer o consumo. 

Trocando em miúdos, pela decisão a capitalização dos juros deve estar inscrita no contrato e o consumidor deve assinar na linha pontilhada no final. 

Simples, o gerente do banco mostra o contrato e diz: “Leia, por favor!” 

Você passa os olhos e assina o contrato junto com uma nota promissória – e com as bênçãos do Poder Judiciário brasileiro está tudo perfeito…

De outra sorte, o STF, em 1961, analisava esta questão e em brilhante decisão afirmou que a vedação legal do anatocismo é de ordem pública, prevalecendo sobre a convenção das partes (RE nº 47.497 – SP); assim não importava o contrato assinado entre as partes, na bacia das almas do contrato financeiro.

O assunto é velho, e muito bem descrito na decisão do Supremo, o jurista Teixeira de Freitas, na sua Consolidação das Leis Civis (de 1856, p. 121), afirmava que era possível a capitalização dos juros, desde que pactuada pelas partes. O jurista Lacerda de Almeida (1897) era contrário a esta posição. 

Acontece que naquele tempo, quem assinava contrato com os bancos estava em posição de igualdade, falava grosso com os banqueiros, não havia classe média no Brasil, que somente surgiu na década de 40 do século passado; assim, falar em acerto entre as partes era possível.

Com o surgimento dos contratos de massa, e a ascendente classes ´C´ e ´D´, terem mais dinheiro, ter acesso a financiamentos e conta corrente em banco, não significam que se possa discutir de igual para igual um contrato. O próprio Código de Defesa do Consumidor fulmina esta pretensa situação ideal e confere prevalência aos consumidores.

Este assunto pode ser que não suba para apreciação do Supremo Tribunal Federal, diante de mecanismos processuais impeditivos; rezemos para que esta decisão seja revertida.

Com efeito, é necessário se discutir profundamente o acerto ou desacerto dessa decisão do STJ. A repercussão social disto nos faz lembrar da grande quebra bancária de 2008 nos Estados Unidos, onde mais de 400 bancos foram à bancarrota, diante da cascata financeira impossível de ser cumprida pelos mutuários norte-americanos. 

Até agora o sistema bancário norte-americano está mancando. A sanha das instituições financeiras deu no que deu, toda sociedade está padecendo os efeitos da quebra. 

A lição é simples e vinha dos nossos avós: “Quem nunca comeu melado, quando come se lambuza“. 

Notas
http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&;tmp.texto=106280 
http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&;docID=146791

Autor: Cláudio Henrique de Castro, Advogado (OAB/PR nº 23.743)
Fonte: www.espacovital.com.br